quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Especialista fala sobre suicídio e depressão no trabalho .


Portugal - Nos últimos anos, três ferramentas de gestão estiveram na base de uma transformação radical da maneira como trabalhamos: a avaliação individual do desempenho, a exigência de "qualidade total" e o outsourcing. O fenômeno gerou doenças mentais ligadas ao trabalho. Christophe Dejours, especialista na matéria, desmonta a espiral de solidão e de desespero que pode levar ao suicídio.



Psiquiatra, psicanalista e professor no Conservatoire National des Arts et Métiers, em Paris, Christophe Dejours dirige ali o Laboratório de Psicologia do Trabalho e da Acção - uma das raras equipas no mundo que estuda a relação entre trabalho e doença mental. Esteve há dias em Lisboa, onde tratou do sofrimento no trabalho. Não apenas do sofrimento enquanto gerador de patologias mentais ou de esgotamentos, mas sobretudo enquanto base para a realização pessoal. Não há "trabalho vivo" sem sofrimento, sem afeto, sem envolvimento pessoal, explicou. É o sofrimento que mobiliza a inteligência e guia a intuição no trabalho, que permite chegar à solução que se procura.


Claro que no outro extremo da escala, nas condições de injustiça ou de assédio que hoje em dia se vivem por vezes nas empresas, há um tipo de sofrimento no trabalho que conduz ao isolamento, ao desespero, à depressão. No seu último livro, publicado há alguns meses em França e intitulado "Suicide et Travail: Que Faire?" , Dejours aborda especificamente a questão do suicídio no trabalho, que se tornou muito midiática com os suicídios verificados recentemente na France Télécom.


Depois da conferência, o médico e cientista falou sobre as causas laborais desses gestos extremos, trágicos e irreversíveis. Mais geralmente, explicou como a destruição pelos gestores dos elos sociais no trabalho nos fragiliza a todos perante a doença mental.


O suicídio ligado ao trabalho é um fenômeno novo?

O que é muito novo é a emergência de suicídios e de tentativas de suicídio no próprio local de trabalho. Apareceu na França há apenas 12, 13 anos. E não só na França - as primeiras investigações foram feitas na Bélgica, nas linhas de montagem de automóveis alemães. É um fenômeno que atinge todos os países ocidentais. O fato de as pessoas irem suicidar-se no local de trabalho tem obviamente um significado. É uma mensagem extremamente brutal, a pior que se possa imaginar - mas não é uma chantagem, porque essas pessoas não ganham nada com o seu suicídio. É dirigida à comunidade de trabalho, aos colegas, ao chefe, aos subalternos, à empresa. Toda a questão reside em descodificar essa mensagem.


Afeta certas categorias de trabalhadores mais do que outras?

Na minha experiência, há suicídios em todas as categorias - nas linhas de montagem, entre os quadros superiores das telecomunicações, entre os bancários, nos trabalhadores dos serviços, nas atividades industriais, na agricultura. No passado, não havia suicídios ligados ao trabalho na indústria. Eram os agricultores que se suicidavam por causa do trabalho - os assalariados agrícolas e os pequenos proprietários cuja actividade tinha sido destruída pela concorrência das grandes explorações. Ainda há suicídios no mundo agrícola.

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